Uma aprendizagem ou O Livro dos Prazeres







Em cada página um passo adiante rumo ao desconhecido... "Quem sou eu?" Perguntas exigindo respostas, o mundo desejando ser lido, vivido, comido. A mulher fluindo em sua existência desconhecendo o que já existe e elaborando a aprendizagem de si mesma ou o amor pelas coisas e e pelo mundo. E Ulisses? Lóri inicia após uma pausa sua história de descobrimentos. Petisque:


"(...) Eu não digo que eu tenha muito, mas tenho ainda a procura infinita e uma esperança violenta. Não esta sua voz baixa e doce. E eu não choro, se for preciso um dia eu grito, Lóri." p.47 


"Olhe para todos a seu redor e veja o que temos feito de nós.
Não temos amado, acima de todas as coisas. Não temos aceito o que não entendemos porque não queremos passar por tolos. Temos amontoado coisas, coisas e coisas, mas não temos um ao outro. Não temos nenhuma alegria que já não esteja catalogada. Temos construído catedrais, e ficado do lado de fora, pois as catedrais que nós mesmos construímos, tememos que sejam armadilhas. Não nos temos entregue a nós mesmos, pois isso seria o começo de uma vida larga e nós a tememos. Temos evitado cair de joelhos diante do primeiro de nós que por amor diga: tens medo. Temos organizado associações e clubes sorridentes onde se serve com ou sem soda. Temos procurado nos salvar, mas sem usar a palavra salvação para não nos envergonharmos de ser inocentes. Não temos usado a palavra amor para não termos de reconhecer sua contextura de ódio, de ciúme e de tantos outros contraditórios. Temos mantido em segredo a nossa morte para tornar nossa vida possível. Muitos de nós fazem arte por não saber como é a outra coisa. Temos disfarçado com falso amor a nossa indiferença, sabendo que nossa indiferença é angústia disfarçada. Temos disfarçado com o pequeno medo o grande medo maior e por isso nunca falamos o que realmente importa.Falar no que realmente importa é considerado uma gafe. Não temos adorado por termos a sensata mesquinhez de nos lembrarmos a tempo dos falsos deuses. Não temos sido puros e ingênuos
 para não rirmos de nós mesmos e para que no fim do dia possamos dizer "pelo menos não fui tolo" e assim não ficarmos perplexos antes de apagar a luz. Temos sorrido em público do que não sorriríamos quando ficássemos sozinhos. Temos chamado de fraqueza a nossa candura. Temo-nos temido um ao outro, acima de tudo. E a tudo isso consideramos a vitória nossa de cada dia." 




in: LISPECTOR, Clarice. Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres. Rio de Janeiro: Rocco, 1998. pgs 47,48.
Boa Leitura!